sábado, setembro 30, 2006
Talvez
O meu coração desfaz-se em pétalas mil
Lanço-as ao vento
Talvez um pássaro passe
E as leve
Suavemente
E as solte
Talvez
E ternamente
O meu coração
Floresça
Num sorriso fértil.
Sandra Cardoso
quinta-feira, setembro 28, 2006
O GRITO
Edvard Munch
(1863-1944)
quarta-feira, setembro 27, 2006
O Canto dos Sonhos, 3
imagem de Alexandre Costa
A tua morte é sempre nova em mim.
Não amadurece. Não tem fim.
Se ergo os olhos de um livro, de repente
tu morreste.
Acordo, e tu morreste.
Sempre, cada dia, cada instante,
a tua morte é nova em mim,
sempre impossível.
E assim, até à noite final
irás morrendo a cada instante
da vida que ficou fingindo vida.
Redescubro a tua morte como outros
descobrem o amor,
porque em cada lugar, cada momento,
tu estás viva.
Viverei até à hora derradeira a tua morte.
Aos goles, lentos goles. Como se fosse
cada vez um veneno novo.
Não é tanto a saudade que dói, mas o remorso.
O remorso de todo o perdido em nossa vida,
coisas de antes e depois, coisas de nunca,
palavras mudas para sempre, um gesto
que sem remédio jamais teve destino,
o olhar que procura e nunca tem resposta.
O único presente verdadeiro é teres partido.
Adolfo Casais Monteiro
(Excerto)
À memória de Raquel Moacir
in Antologia Pessoal da Poesia Portuguesa
de Eugénio de Andrade
Campo de Letras, 3ª ed., p.438
domingo, setembro 24, 2006
Diálogos soltos
sábado, setembro 23, 2006
DÁ QUE PENSAR, 2
"O hospital é um gigantesco edifício atravessado por corredores , onde nunca é de noite nem muda a temperatura, o dia deteve-se nas lâmpadas e o Verão nos aquecedores. As rotinas repetem-se com ardilosa precisão; é o reino da dor, aqui chega-se para sofrer, assim o compreendemos todos. As misérias da doença igualam-nos, não há ricos nem pobres, ao atravessar este umbral os privilégios desfazem-se em fumo e tornamo-nos humildes."
sexta-feira, setembro 22, 2006
quinta-feira, setembro 21, 2006
NO MAN'S LAND
quarta-feira, setembro 20, 2006
A veia do poeta
Cansado do movimento
Que percorre a linha recta
Fui ficando mais atento
Ao voo da borboleta
Fui subindo em espiral
Declarando-me estafeta
Entre o corpo do real
E a veia do poeta
Mas ela não se detecta
À vista desarmada
E o sangue que lá corre
Em torrente delicada
É a lágrima perpétua
Sai da ponta da caneta
Vai ao fim da via láctea
E cai no fundo da gaveta
Ai de quem nunca guardou
Um pouco da sua alma
Numa folha secreta
Ai de quem nunca guardou
Um pouco da sua alma
No fundo de uma gaveta
Ai de quem nunca injectou
Um pouco da sua mágoa
Na veia do poeta
Carlos Tê/Rui Veloso
in A espuma das Canções
2005 EMI Music Portugal, Lda
terça-feira, setembro 19, 2006
CIDADE
imagem de Mônica Delicato
O filho pela mão, vamos por estas ruas
esconjurando sombras, convocando
dunas, potros, o sol ainda fresco,
os cachorros latindo de alegria.
Meu olhos vão à frente farejando,
enquanto a mão dele ilumina a minha.
Eugénio de Andrade
in O Outro Nome da Terra
Editora Limiar, 1988, 1ª ed., p.19
sábado, setembro 16, 2006
NOITE
imagem de Bart
Não temas a noite, meu filho,
Que a noite nem sempre é escura
E há estrelas lá no alto
Cujo brilho também dura
E beija o teu olhar
Iluminando o caminho
Que sozinho hás-de traçar
Com teu passo miudinho.
Não temas a noite, meu filho,
Que o sol há-de nascer
Para aquecer o teu sorriso
E te ensinar a crescer
Não temas a noite, meu filho,
Que a lua conta histórias
De um menino muito triste
Que só conhecerá vitórias.
Sandra Cardoso
quinta-feira, setembro 14, 2006
Alpha et Omega
Escorro-te por entre os dedos
Lentamente
Numa última carícia
Lembrando tardes de Junho
Quente
E tu sentes.
E não juntas as mãos
Em concha
Para me beberes.
terça-feira, setembro 12, 2006
O Canto dos Sonhos
Familiale
La mère fait du tricot
Le fils fait la guerre
Elle trouve ça tout naturel la mère
Et le père qu'est-ce qu'il fait le père?
Il fait des affaires
Sa femme fait du tricot
Son fils la guerre
Lui des affaires
Il trouve ça tout naturel le père
Et le fils et le fils
Qu'est-ce qu'il trouve le fils
Il ne trouve rien absolument rien le fils
Le fils sa mère fait du tricot son père des affaires lui la guerre
Quand il aura fini la guerre
Il fera des affaires avec son père
La guerre continue la mère continue elle tricote
Le père continue il fait des affaires
Le fils est tué il ne continue plus
Le père et la mère vont au cimetière
Ils trouvent ça tout naturel le père et la mère
La vie continue la vie avec le tricot la guerre les affaires
Les affaires la guerre le tricot la guerre
Les affaires les affaires et les affaires
La vie avec le cimetière
Jacques Prévert
in Etranges Etrangers et autres poèmes
Gallimard Jeunesse, 2000, pags 17-18
segunda-feira, setembro 11, 2006
As Torres Gémeas
No dia em que se recordam as vítimas do 11 de Setembro, será muito desumano perguntar quantas torres, gémeas ou não, já terão os Estados-Unidos derrubado?
domingo, setembro 10, 2006
AOS MEUS AMIGOS
imagem de
Pinto da Silva
- Adeus - disse a raposa- Vou-te contar o tal segredo. É muito simples: só se vê bem com o coração. O essencial é invisível para os olhos ...
- O essencial é invisível para os olhos - repetiu o principezinho, para nunca mais se esquecer.
- Foi o tempo que tu perdeste com a tua rosa que tornou a tua rosa tão importante.
- Foi o tempo que eu perdi com a minha rosa ... - repetiu o principezinho, para nunca mais se esquecer.
- Os homens já se esqueceram desta verdade - disse a raposa. - Mas tu não te deves esquecer dela. Ficas responsável para todo o sempre por aquilo que está preso a ti. Tu és responsável pela tua rosa ...
- Sou responsável pela minha rosa ... - repetiu o principezinho para nunca mais se esquecer."
Antoine de Saint-Exupéry
in O Principezinho
Editora Caravela, 18ª Ed., p.74
sexta-feira, setembro 08, 2006
DÁ QUE PENSAR
José Luís Peixoto
in Nenhum Olhar
Temas e Debates, 4ª ed.
quinta-feira, setembro 07, 2006
Hino à deusa Ísis
séc III ou IV, descoberto em Nag Hammadi
quarta-feira, setembro 06, 2006
LUZ
imagem de Raquel
No dia em que tiraste os óculos
E mergulhaste em mim
Tacteando todos os ângulos
Traçando novas rectas e circunferências
Nos nossos corpos suados
De estudar tardes de Primavera
No dia em que dançámos ao luar
Na mecânica perfeita dos corpos abertos
Entrando e saindo
Claridade por todos os nossos poros
Até explodirmos num canto de sereias
No dia em que, exaustos,
Nossos corpos se espantaram
Por serem um
E choraram lágrimas de luz
Até adormecerem nos braços da aurora,
Cúmplice dos amantes
Nesse dia, eu soube
Que era a primeira
E a última
Sandra Cardoso
in JN
16.IX.2006, p. 19
segunda-feira, setembro 04, 2006
Céus!
Bebo os teus beijos em pequenos goles
E sinto-os a deslizar em mim
Lentamente
Gota a gota
Tranformando-se em mar.
Sandra Cardoso
Julho 2006
domingo, setembro 03, 2006
As estrelas do céu
Sandra Cardoso
Set. 2006