quarta-feira, setembro 27, 2006

O Canto dos Sonhos, 3


A TUA MORTE EM MIM


imagem de Alexandre Costa


A tua morte é sempre nova em mim.
Não amadurece. Não tem fim.
Se ergo os olhos de um livro, de repente
tu morreste.
Acordo, e tu morreste.
Sempre, cada dia, cada instante,
a tua morte é nova em mim,
sempre impossível.

E assim, até à noite final
irás morrendo a cada instante
da vida que ficou fingindo vida.
Redescubro a tua morte como outros
descobrem o amor,
porque em cada lugar, cada momento,
tu estás viva.

Viverei até à hora derradeira a tua morte.
Aos goles, lentos goles. Como se fosse
cada vez um veneno novo.
Não é tanto a saudade que dói, mas o remorso.
O remorso de todo o perdido em nossa vida,
coisas de antes e depois, coisas de nunca,
palavras mudas para sempre, um gesto
que sem remédio jamais teve destino,
o olhar que procura e nunca tem resposta.

O único presente verdadeiro é teres partido.


Adolfo Casais Monteiro

(Excerto)
À memória de Raquel Moacir


in Antologia Pessoal da Poesia Portuguesa
de Eugénio de Andrade
Campo de Letras, 3ª ed., p.438

1 comentário:

Catarina Alves disse...

Parabéns, muito bonito... boa escolha.

Um abraço

Nani