domingo, dezembro 31, 2006

Geisa Cruvinel

Querido amigo:

Tenho pensado muito em ti, nestes últimos dias.

Todos falam na mudança de ano. E é mesmo por isso que eu penso em ti, porque vamos ter algo de novo, finalmente, e já não precisas de ir para o colégio. De certeza que, com este ano novo, as casas de banho da nossa escola já vão ter papel higiénico, e já vamos poder lavar as mãos com sabonete e secá-las sem ser na nossa roupa! E também devem substituir o coberto, onde nos abrigamos durante os dias em que está a chover, por uma sala grande e quente onde nos possamos divertir. E de certeza que vão tratar do chão do recreio, que é em terra, e em dias de chuva é de lama!. Lembras-te quando o Gonçalo te empurrou e caíste direitinho na poça?! Foi uma risota, mas tu é que não achaste piada nenhuma!! Uma semana em casa doente por teres estado o dia todo com a roupa molhada...

Um novo ano...Eu sei que tudo isto já existe há mais de dez, disse-me a minha prima que também andou na nossa escola, eu sei, mas agora vai ocorrer uma mudança e não acredito que seja só mudar o 6 para o 7. Se fosse só isso, para quê tanta azáfama?!! Algo mais tem de acontecer, não achas?

Um beijinho

Ana

P.S. Se não nos virmos antes, desejo-te um feliz, mesmo muito feliz 2007 !


segunda-feira, dezembro 25, 2006

Pedro Fernandes




Nada te obriga, nesta tarde fria

Aos passos duros, sujos e frenéticos

Tosca peregrinação alucinada

Ao templo atulhado de vazios.

Liberta a alma, olha para o nada!...



Margarida Correia
2006

segunda-feira, dezembro 18, 2006

Dá que pensar, 10

Erik Reis

" Os huincas são pessoas, morrem como os mapuche, mas comportam-se como demónios. No Norte, queimaram vivas tribos inteiras. Querem que aceitemos o seu deus pregado numa cruz, deus da morte, que nos submetamos ao seu rei, que não vive aqui e que não conhecemos, querem ocupar a nossa terra e fazer de nós seus escravos. Porquê, pergunto-vos eu? Por nada, irmãos. Eles não apreciam a liberdade. Não entendem o orgulho, são obedientes, põem-se de joelhos no chão e baixam a cabeça. Não sabem nada de justiça ou retribuição. Os huincas são loucos mas são loucos malévolos. E eu digo-vos irmãos, que nunca seremos seus prisioneiros, e morreremos lutando."

Isabel Allende

in Inés da Minha Alma
Difel, 2006, p.295

Nota: Os Huincas são os espanhóis que conquistaram e fundaram o Chile. Os Mapuche são os índios que habitavam nessa região.

quarta-feira, dezembro 13, 2006

MAR MEU

Rafael Almeida


Estás ali: quando a terra acaba
Começas tu – mar meu
Como fico extasiado só de te ver assim calmo, ondulado na minha paisagem
Eu sou terra, tu és mar

Aventurei-me a navegar nas tuas águas serenas
A embarcação era frágil mas carregava cheia, vontade
E fui

Teu coral reflectia o encanto interior
E será sempre bonito a qualquer olhar lúcido
Nas ondas da paixão me entreguei
Balancei atordoado
Sinto que já não sou terra no barco mas só água – tua
Fiz-me líquido para me moldar às tuas formas
Que bem que fiquei
Coexisto alagado, sem querer regressar
Contigo flutuo sem sequer saber nadar
Deste-me a mão
Levaste-me na tua corrente a passear às profundezas
Perdemo-nos mutuamente
Depois pingamos fragmentos de felicidade
E continuamos assim molhados de saudade

Na insossa realidade esvaída de arte
Dedicaste o poema sentido
Levei a música ao teu festival
E tudo isto ficou pintado com tuas cores no vitral...

O farol adivinha tempestades
Pois que adivinhe, eu prefiro-te a ti
Apenas importa que não percas o teu sorriso lindo

Mar meu: não consigo ignorar-te
Tenho sede da tua água que nunca me basta
Ao menos, espero um dia consintas afogar-me em ti
E fazer parte do teu líquido estrutural

Sei que na tua imensidão oceânica
Abraças outras praias, outras terras
E como tenho inveja, ciúme dessas felizes areias acariciadas
Queria ser um rio – o único - que te enchesse de recordações
Mas existem outros (mais importantes) que também aspiram a essa felicidade
Não posso competir e existo só para verificar que cuidas de ti

No limiar das forças procuro o sal da tua alma
Que me tempera a existência
E não receio engrossar uma fila
Num qualquer consultório de hipertensos

Sim, fiquei viciado em ti
Na substância que te corre nas veias e alimenta o nosso mundo e outros
Sou dependente

Mas um maremoto devolveu-me à condição esquecida
Agora, quero apenas esperar na tua praia
E sonhar que voltes numa próxima maré...


Celso Silva
2004

sexta-feira, dezembro 08, 2006

Canto dos Sonhos, 9

CORPO DE AROMA

X. Maya

Se foste corola ou barco,
mas quando?
minha irmã,
minha leve amante, minha árvore,
que o mundo levantava
na inocência absoluta
do instante.
Alta estavas no amplo e recolhida
como um lâmpada,
alta estavas na varanda branca.
Se acaso ainda podes ser aroma
dos meus olhos,
corpo no corpo,
retiro e substância, linha alta
da delícia,
nada te pedirei na minha ânsia
de puro espaço,
de azul imediato,
de luz para o olvido e o deserto.

António Ramos Rosa

in Antologia Pessoal da Poesia Portuguesa
Eugénio de Andrade (org.)
Campo das Letras, 2000, p.503

quarta-feira, dezembro 06, 2006

Canto dos Sonhos, 8

A ÁRVORE DO SILÊNCIO





Se a nossa voz crescesse, onde era a árvore?
Em que pontas, a corola do silêncio?
Coração já cansado, és a raiz:
Uma ave te passe a outro país.

Coisas de terra são palavra:
Semeia o que calou.
Não faz sentido quem lavra
Se o não colhe do que amou.

Assim sílaba e folha, porque não
Num só ramo levá-las
Com a graça e o redondo de uma mão?

(Tu não te calas? Tu não te calas?!)


Vitorino Nemésio

in Antologia Pessoal da Poesia Portuguesa
Eugénio de Andrade (org.)
Campo das Letras, 2000, p. 420

terça-feira, dezembro 05, 2006

Inche Lautaro!

Bart


"Lautaro foge de Santiago na noite mais escura de Verão, sem ser visto pelas sentinelas e sem alertar os cães, que o conhecem. Corre pela ribeira do Mapocho, escondido pela vegetação de canas e fetos. Não usa a ponte de cordas dos huincas, atira-se às águas negras e nada, com um grito de felicidade sufocado no peito. A água fria lava-o por dentro e por fora, deixando-o limpo do odor dos huincas. Com grandes braçadas, cruza o rio e emerge na outra margem recém-nascido. Inche Lautaro! Sou Lautaro!, grita."

Isabel Allende
in Inés da Minha Alma
Difel, Set.2006, p.293

segunda-feira, dezembro 04, 2006

Manhã


Alba Luna


Sei o perfume da flor

aberta que em peito

meu amanheceste

alvo.


Claridade azul

rompendo florestas de silêncios.



Sandra Cardoso





sexta-feira, dezembro 01, 2006

Dia Mundial da Sida

Pedro Trigo Moutinho

Tens ... consciência?

Então usa-a!